Preparava-se para seguir Qhorin e os outros quando vislumbrou um relâmpago branco entre dois pedregulhos.
Qhorin Meia-Mão estava em pé junto a ele.
– Como é que ele está?
Como que em resposta, Fantasma levantou-se com dificuldade.
– O lobo é forte – o patrulheiro observou. – Ebben, água. Cobra das Pedras, o seu odre de vinho. Mantenha-o imóvel, Jon.
Juntos, lavaram o sangue coagulado do pelo do lobo gigante. Fantasma sacudiu-se e mostrou os dentes quando Qhorin despejou o vinho nos irregulares ferimentos vermelhos que os golpes da águia lhe deixara, mas Jon o envolveu nos braços e murmurou palavras para acalmá-lo, e rapidamente o lobo sossegou. Quando rasgaram um pedaço do manto de Jon para cobrir suas feridas, a escuridão caíra por completo. Só uma poeira de estrelas permitia distinguir o negro do céu do negro da rocha.
– Prosseguimos? – quis saber Cobra das Pedras.
Qhorin dirigiu-se ao garrano.
– Adiante não, para trás.
– Para trás? – Jon foi pego de surpresa.
– As águias têm olhos mais penetrantes do que os homens. Fomos vistos. Portanto, agora fugimos – Meia-Mão enrolou um longo cachecol negro em volta da cabeça e saltou para a sela.
Os outros patrulheiros trocaram olhares, mas nenhum dos homens pensou em discutir. Um por um, todos montaram e viraram as montarias para casa.
– Fantasma, vem – chamou Jon, e o lobo gigante o seguiu, uma sombra clara deslocando-se pela noite.
Avançaram por toda a noite, tateando o caminho ao longo do passo retorcido e através das extensões de solo rachado. O vento foi se tornando mais forte. Por vezes, ficava tão escuro que desmontavam e seguiam a pé, cada um levando seu garrano pelas rédeas. Uma vez, Ebben sugeriu que algumas tochas poderiam servi-los bem, mas Qhorin disse: “Nada de fogo”, e foi o fim da conversa. Chegaram à ponte de pedra do cume, e recomeçaram a descer. No meio das trevas, um gato-das-sombras gritou de fúria, com a voz reverberando nas pedras, fazendo parecer que uma dúzia de outros gatos estavam respondendo. Uma vez, Jon pensou ter visto um par de olhos cintilantes numa saliência acima dele, grandes como a lua cheia de Outono.
Na hora negra que antecedia a alvorada, pararam para deixar que os cavalos bebessem, e os alimentaram com um punhado de aveia e um maço ou dois de feno.
– Não estamos longe do local onde os selvagens morreram – Qhorin avisou. – Daqui, um homem poderia conter uma centena. O homem certo – e olhou para o Escudeiro Dalbridge.
O escudeiro inclinou a cabeça:
– Deixem-me todas as flechas de que possam dispor, irmãos – ele tocou no arco. – E deem uma maçã ao meu garrano quando chegar em casa. Ele merece, pobre animal.
Qhorin apertou o antebraço do escudeiro com uma mão enluvada.
– Se a águia descer para vê-lo melhor…
– … vai ganhar algumas penas novas.
A última coisa que Jon viu do Escudeiro Dalbridge foram suas costas enquanto ele escalava o estreito caminho que levava às alturas.
Quando a aurora veio, Jon olhou para um céu sem nuvens e viu um ponto em movimento através do azul. Ebben também o viu, e praguejou, mas Qhorin disse-lhe para ficar calado.
– Escute.
Jon prendeu a respiração e ouviu. Longe e atrás deles, o chamado de um berrante ecoou nas montanhas.
– E agora eles vêm – Qhorin concluiu.
Tyrion
Pod vestiu-o para a provação numa túnica de veludo molhado no carmesim dos Lannister e trouxe-lhe o colar de seu cargo. Tyrion deixou-o na mesa de cabeceira. A irmã não apreciava ser lembrada de que ele era a Mão do Rei, e ele não desejava inflamar ainda mais a relação entre ambos.
Varys alcançou-o enquanto atravessava o pátio.
– Senhor – disse o eunuco, um pouco ofegante. – É melhor que leia isto imediatamente – estendeu-lhe um pergaminho na sua suave mão branca. – Um relatório vindo do norte.
– Boas ou más notícias? – Tyrion perguntou.
– Não me compete julgar isso.
Tyrion desenrolou o pergaminho. Teve de semicerrar os olhos para ler as palavras no pátio iluminado por archotes.
– Que os deuses sejam bons – disse em voz baixa. – Os dois?
– Temo que sim, senhor. É tão triste. Tão dolorosamente triste. E eles tão novos e inocentes.
Tyrion recordou-se de como os lobos uivaram quando o garoto Stark caíra.
– Informou mais alguém? – Tyrion quis saber.
– Ainda não, embora seja claro que eu tenha de fazer isso.
Tyrion enrolou a carta.
– Eu contarei a minha irmã – queria ver como ela receberia a notícia. Queria muito ver isso.