Tyrion fitou as borras no fundo de sua taça de vinho.
– Pelo que sei, pode perfeitamente já tê-la matado.
– Gostaria de vê-la? Pensei que sim – Cersei atravessou a sala e escancarou a pesada porta de carvalho. – Traga a vadia do meu irmão.
Os irmãos de Sor Osmund, Osney e Osfryd, eram o retrato perfeito um do outro, homens altos, com nariz adunco, cabelos escuros e sorriso cruel. Ela pendia entre eles, de olhos muito abertos e brancos em seu rosto escuro. Escorria sangue de seu lábio aberto, e Tyrion conseguia ver hematomas através das roupas rasgadas. Suas mãos estavam atadas com cordas, e tinham-na amordaçado para que não falasse.
– Disse que não seria machucada.
– Ela lutou – ao contrário dos irmãos, Osney Kettleblack estava perfeitamente barbeado, e viam-se bem os arranhões no rosto despido de pelos. – Esta aqui tem garras como as de um gato-das-sombras.
– Os hematomas somem – Cersei disse num tom entediado. – A vadia sobreviverá. Desde que Joff sobreviva.
Tyrion quis rir dela. Teria sido tão bom, tão, mas tão bom, mas isso significaria entregar o jogo.
Em vez disso, olhou para a garota e disse:
– Jura que a libertará depois da batalha?
– Se libertar Tommen, sim.
Tyrion ficou de pé:
– Então fique com ela, mas mantenha-a em segurança. Se esses animais julgam que podem usá-la… Bem, querida irmã, deixe-me só reforçar que uma balança pende para os dois lados – seu tom de voz era calmo, monocórdio, indiferente; tinha procurado a voz do pai, e a encontrou. – O que quer que lhe aconteça acontecerá também a Tommen, e isso inclui espancamentos e violações –
Cersei não esperava aquilo:
– Não se atreveria.
Tyrion obrigou-se a sorrir, um sorriso lento e frio. Verde e negro, seus olhos riram dela.
– Atrever? Vou fazê-lo em pessoa.
A mão da irmã avançou sobre seu rosto, mas ele pegou seu pulso e o torceu, até ela gritar. Osfryd moveu-se em seu auxílio.
– Mais um passo e quebro o braço dela – o anão o preveniu. O homem parou. – Lembra-se de quando lhe disse que não voltaria a me bater, Cersei? – atirou-a ao chão e virou-se para os Kettleblack: – Desamarrem-na, e tirem essa mordaça.
A corda estava tão apertada que tinha impedido seu sangue de chegar às mãos. A moça gritou de dor quando a circulação voltou. Tyrion massageou seus dedos suavemente até a sensibilidade voltar.
– Querida – disse –, precisa ter coragem. Lamento que a tenham machucado.
– Eu sei que me libertará, senhor.
– Libertarei – ele prometeu, e Alayaya dobrou-se e lhe deu um beijo na testa. Seus lábios feridos deixaram uma mancha de sangue onde o tocaram.
O sangue dela ainda o manchava quando olhou para a rainha.
– Nunca gostei de você, Cersei, mas era minha irmã, e nunca lhe fiz nenhum mal. Você acabou com isso. Vou feri-la por causa disto. Ainda não sei como, mas dê-me tempo. Chegará um dia em que você vai se achar a salvo e feliz, e de repente a alegria vai se transformar em cinzas na sua boca, e saberá que a dívida está paga.
Na guerra, dissera-lhe o pai um dia, a batalha acaba no instante em que um exército cede e foge. Não importa que continuem a ser tão numerosos como eram no momento anterior, ainda com armas e armaduras; uma vez que fugiram à nossa frente, não retornarão para lutar. Aconteceu o mesmo com Cersei.
– Sai! – foi toda a resposta que conseguiu encontrar. – Sai da minha vista!
Tyrion fez uma reverência:
– Então, boa noite. E tenha sonhos agradáveis.
Dirigiu-se à Torre da Mão com mil pés de aço marchando através do seu crânio.