Um pouco adiante, vislumbraram uma cabana de lenhador rodeada de árvores antigas e de troncos ordenadamente empilhados, prontos para virar lenhas, e mais tarde viram uma casa de palafitas decrépita, que se debruçava sobre o rio, apoiada em estacas com três metros de altura, ambos desertos. Passaram por mais campos, de trigo, milho e cevada amadurecendo ao sol, mas não havia homens sentados nas árvores ou percorrendo as fileiras com foices. Por fim, a vila surgiu à vista; um aglomerado de casas brancas espalhadas em torno das muralhas de um castro, um grande septo com um telhado de madeira, a casa-torre do senhor empoleirada numa pequena elevação a oeste… E nenhum sinal de gente em parte alguma.
Yoren ficou sentado no cavalo, franzindo o cenho por entre o emaranhado da barba:
– Não gosto disso. Mas está aí. Vamos dar uma espiada. E que seja
O irmão negro deixou dez homens guardando as carroças e a garotinha chorona e dividiu o resto em grupos de cinco para fazer uma busca na vila.
– Fiquem de olhos e ouvidos abertos – Yoren os preveniu, antes de se dirigir à casa-torre a fim de ver se havia algum sinal do fidalgo ou dos seus guardas.
Arya viu-se na companhia de Gendry, Torta Quente e Lommy. O atarracado Woth, com sua barriga redonda, tinha antigamente puxado remos numa galé, o que fazia dele o mais próximo que tinham de um marinheiro. Por isso Yoren lhe disse para levá-los até a margem do lago e ver se conseguiam encontrar um barco. Enquanto avançavam a cavalo por entre as silenciosas casas brancas, um arrepio percorreu os braços de Arya. Aquela vila vazia assustava-a quase tanto como o castro queimado onde tinham encontrado a menina chorona e a mulher sem um braço. Por que as pessoas teriam fugido, abandonando suas casas e tudo o mais? O que poderia tê-las assustado tanto?
O sol estava baixo para oeste, e as casas lançavam longas sombras escuras. Um súbito estrondo fez Arya levar a mão à Agulha, mas era apenas uma veneziana batendo com o vento. Depois da margem aberta do rio, a proximidade da vila a deixava cada vez mais nervosa.
Quando vislumbrou o lago à sua frente, por entre as casas e as árvores, Arya bateu os calcanhares no cavalo e passou a galope por Woth e Gendry. Irrompeu no relvado junto à margem pedregosa. O sol poente fazia a superfície tranquila da água cintilar como uma folha de cobre martelado. Era o maior lago que já vira, sem sinal da margem oposta. Viu uma estalagem torta à sua esquerda, construída sobre a água em pesados pilares de madeira. À direita, um longo cais projetava-se lago adentro e havia outras docas mais a leste, dedos de madeira que se estendiam da vila. Mas o único barco que estava visível era um a remo, virado ao contrário, abandonado nas pedras sob a estalagem, com o casco completamente apodrecido.
– Desapareceram – disse Arya, abatida. O que faremos agora?
– Há uma estalagem – disse Lommy quando os outros se aproximaram. – Acham que deixaram alguma comida? Ou cerveja?
– Vamos ver – sugeriu Torta Quente.
– Não liguem para a estalagem – Woth exclamou. – Yoren disse para encontrarmos um barco.
– Eles levaram os barcos.
De algum modo, Arya sabia que era verdade; poderiam revistar a vila inteira, e não encontrariam mais do que o bote a remo de ponta-cabeça. Desanimada, saltou do cavalo e se ajoelhou junto ao lago. A água bateu suavemente em volta das suas pernas. Alguns vaga-lumes estavam surgindo, com suas luzinhas piscando. A água verde estava morna como lágrimas, mas nela não havia sal. Tinha gosto de verão, lama e coisas que cresciam. Arya mergulhou o rosto para lavar a poeira, a sujeira e o suor do dia. Quando se inclinou para trás, a água escorreu por seu pescoço e entrou pelo colarinho. Era bom. Desejou poder tirar a roupa e nadar, deslizando pela água morna como uma lontra cor-de-rosa e magricela. Talvez pudesse percorrer a nado todo o caminho até Winterfell.
Woth estava gritando para que ela o ajudasse a procurar, e foi o que ela fez, espreitando docas e barracões para barcos, enquanto seu cavalo pastava na margem. Encontraram algumas velas e cavilhas, além de alguns baldes de alcatrão endurecido e uma gata com uma ninhada de gatinhos recém-nascidos. Mas nada de barcos.
A vila estava escura como uma floresta quando Yoren e os outros reapareceram.
– A torre está vazia. O senhor saiu para lutar, talvez, ou para deixar seu povo em segurança, não há como saber. Não ficou nem um cavalo ou porco na vila, mas vamos comer. Vi um ganso solto, e algumas galinhas, e há peixe bom no Olho de Deus.
– Os barcos desapareceram – Arya relatou.
– Podíamos remendar o casco daquele bote a remo – Koss sugeriu.
– Podia servir para quatro de nós – Yoren confirmou.
– Tem cavilhas – Lommy interveio – e árvores por todo o lado. Poderíamos fazer barcos para todos.
Yoren cuspiu:
– Sabe alguma coisa sobre construção de barcos, filho de tintureiro?
Lommy ficou sem expressão.