Devia ter dormido, embora não se lembrasse de ter fechado os olhos. Sonhou que um lobo estava uivando, e o som era tão terrível, que a acordou de imediato. Arya sentou-se no colchão de palha com o coração aos saltos.
– Torta Quente, acorda – Arya levantou-se desajeitadamente. – Woth, Gendry, não ouviram? – tentou calçar uma bota.
Em volta dela, homens e garotos agitaram-se e saíram dos colchões.
– O que foi? – Torta Quente perguntou.
– Ouvimos o quê? – Gendry quis saber.
– Arry teve um pesadelo – alguém disse.
– Não, eu ouvi. Um lobo.
–Arry tem lobos na cabeça – Lommy zombou.
– Deixe-os uivar – Gerren falou. – Eles estão lá fora, e nós aqui dentro.
Woth concordou:
– Nunca vi nenhum lobo capaz de assaltar um castro.
Torta Quente estava dizendo:
– Eu não cheguei a ouvir nada.
–
Antes que tivessem tempo para contestá-la, o som chegou até eles, estremecendo na noite… Mas dessa vez não era lobo nenhum, mas Kurz, que soprava seu berrante, avisando do perigo. Num instante, todos foram se vestir e pegar todas as armas que possuíam. Arya correu para o portão enquanto o berrante voltava a soar. Quando passou em disparada pelo celeiro, Dentadas atirou-se furiosamente contra as correntes, e Jaqen H’ghar chamou do fundo da sua carroça:
– Rapaz! Querido rapaz! É a guerra, a guerra vermelha? Rapaz, liberte-nos. Um homem pode lutar.
Ela o ignorou, e continuou a correr, já ouvindo cavalos e gritos do outro lado da muralha. Subiu para a passarela. A balaustrada era um pouco alta demais e Arya, um tanto baixa demais, teve de enfiar os pés nos espaços entre as pedras para conseguir ver. Por um momento, pensou que a vila estivesse cheia de vaga-lumes. Mas então compreendeu que eram homens com tochas, galopando entre as casas. Viu um telhado incendiar-se, com chamas lambendo a barriga da noite, com quentes línguas cor de laranja quando o sapé pegou fogo. Seguiu-se um outro, e depois outro, e em breve havia fogos ardendo em toda parte.
Gendry subiu a seu lado, com o elmo posto.
– Quantos são?
Arya tentou contar, mas cavalgavam depressa demais, com as tochas rodopiando pelo ar quando as atiravam.
– Cem. Duzentos, não sei – sobre o rugido das chamas conseguia ouvir gritos. – Em breve virão atrás de nós.
– Ali – Gendry apontou.
Uma coluna de cavaleiros movia-se por entre os edifícios em chamas, na direção do castro. A luz do fogo relampejava nos elmos de metal e salpicava as cotas de malha e as armaduras com pontos brilhantes laranjas e amarelos. Um deles transportava um estandarte numa grande lança. Arya achou que fosse vermelho, mas era difícil ter certeza durante a noite, com os incêndios rugindo ao seu redor. Tudo parecia vermelho, negro ou laranja.
O fogo saltava de uma casa para a seguinte. Arya viu uma árvore ardendo, com as chamas rastejando pelos seus galhos até se erguer na noite vestida com uma túnica de um laranja vivo. Agora, todos estavam acordados, guarnecendo as passarelas ou lutando com os animais assustados lá embaixo. Conseguia ouvir Yoren gritando ordens. Algo esbarrou em sua perna e, ao olhar para baixo, descobriu a menina chorona agarrada a ela.
– Vá embora! – Arya livrou a perna. – O que está fazendo aqui em cima? Corra e se esconda em qualquer lugar, sua imbecil – empurrou a menina para longe.
Os cavaleiros refrearam os animais perante os portões.
–
– Bem, e que rei é esse? – berrou de volta o velho Reysen antes que Woth conseguisse lhe dar uma pancada para calá-lo.
Yoren subiu à ameia junto ao portão, com o desbotado manto negro atado a uma vara de madeira.
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– E você quem é, velho? Um dos covardes de Lorde Beric? – gritou o cavaleiro com o elmo de espigão. – Se aquele gordo idiota do Thoros estiver aí, pergunte-lhe se gosta
– Não tenho nenhum Thoros aqui – gritou Yoren de volta. – Só uns moços para a Patrulha. Não participo da sua guerra – ergueu a vara, para que os outros vissem a cor do seu manto. – Olhe. Isto é negro, da Patrulha da Noite.
– Ou o negro da Casa Dondarrion – gritou o homem que transportava o estandarte inimigo. Arya via agora mais claramente suas cores à luz da vila que ardia: um leão dourado sobre vermelho. – O brasão de Lorde Beric é um relâmpago roxo em fundo negro.