Eles riram muito daquilo enquanto corriam até uma afetuosa esposa de um moleiro que Patrek conhecia.
O caminho que seguiam retorcia-se cada vez mais para cima, por montes nus e pedregosos. Logo estavam fora da vista do mar, embora o odor do sal ainda pairasse, vivo, no ar úmido. Mantinham um ritmo pesado e constante, passando pelo cercado de um pastor e pelas instalações abandonadas de uma mina. Este novo e santo Aeron Greyjoy não era muito de falar. Por isso avançavam numa melancolia de silêncio. Finalmente, Theon não conseguiu suportá-la mais.
– Robb Stark é agora senhor de Winterfell – ele finalmente disse.
Aeron prosseguiu seu caminho.
– Os lobos são muito iguais uns aos outros.
– Robb quebrou a lealdade ao Trono de Ferro e se fez coroar Rei do Norte. Há guerra.
– Os corvos do meistre voam tão bem sobre o sal como sobre a rocha. Essa notícia é velha e fria.
– Significa um novo dia, tio – Theon falou em tom de promessa.
– Todas as manhãs trazem um novo dia, muito igual ao velho.
– Em Correrrio, diriam outra coisa – Theon respondeu. – Ouvi dizer que o cometa vermelho é um arauto de uma nova era. Um mensageiro dos deuses, dizem.
– É um sinal – concordou o sacerdote –, mas do nosso deus, não dos deles. É uma tocha ardente, como as que a nossa gente transportava nos tempos antigos. É a chama do Deus Afogado trazida do mar e proclama uma maré cheia. É tempo de içar as velas e avançar para o mundo com fogo e espada, como ele fez.
Theon sorriu.
– Concordo em gênero e número.
– Um homem concorda com deus como uma gota de chuva com a tempestade.
O sol estava prestes a se pôr quando chegaram às muralhas de Pyke, um crescente de pedra escura que corria de falésia a falésia, com a guarita ao centro e três torres quadradas de cada lado. Theon ainda conseguia distinguir as cicatrizes deixadas pelas pedras das catapultas de Robert Baratheon. Uma nova torre sul tinha sido erguida das ruínas da antiga, feita de pedras com um tom de cinza mais claro e ainda limpa de manchas de liquens. Fora ali que Robert abrira sua brecha, subindo depois sobre o entulho e os cadáveres com o martelo de guerra na mão, e Ned Stark a seu lado. Theon observara, da segurança da Torre do Mar, e por vezes ainda via os archotes em sonhos e ouvia o estrondo abafado do colapso.
Os portões estavam abertos para ele entrar, com a porta levadiça de ferro enferrujado erguida. Os guardas no topo das ameias observaram, sem o reconhecer, quando Theon Greyjoy voltou finalmente para casa.
Para lá da muralha exterior estendia-se meia centena de acres de promontório, empurrado contra o céu e o mar. Os estábulos ficavam ali, bem como os canis e alguns outros edifícios espalhados. Ovelhas e porcos amontoavam-se nos seus currais, enquanto os cães do castelo corriam em liberdade. Ao sul ficavam as falésias e a larga ponte de pedra que levava à Grande Fortaleza. Theon conseguia ouvir o bater das ondas quando saltou da sela. Um cavalariço veio levar o cavalo. Um par de crianças esqueléticas e alguns servos ficaram olhando-o sem expressão, mas não viu sinal do senhor seu pai nem de mais ninguém que reconhecesse da sua infância.
O sacerdote não desmontou.
– Não vai ficar esta noite para partilhar da nossa comida e bebida, tio?
– Disseram-me traga-o. E eu o trouxe. Agora volto aos assuntos do nosso deus – Aeron Greyjoy virou o cavalo e saiu lentamente do castelo sob os espigões enlameados da porta levadiça.
Uma velha corcunda enfiada num vestido cinza sem forma aproximou-se dele com cautela:
– Senhor, mandaram-me levá-lo aos seus aposentos.
– A pedido de quem?
– Do senhor seu pai, senhor.
Theon puxou as luvas.
– Então você
– Espera-o na Torre do Mar, senhor. Quando estiver descansado da viagem.
– E você, quem é?
– Helya, que mantém o castelo para o senhor seu pai.
– Sylas era o intendente daqui. Chamavam-no de Boca Azeda – mesmo agora, Theon recordava o fedor de vinho do hálito do velho.
– Está morto há cinco anos, senhor.
– E Meistre Qalen, onde está?
– Dorme no mar. Wendamyr cuida agora dos corvos, mas foi para o sul, para Vilavelha, tratar de uns assuntos quaisquer de meistre.
– Leve-me aos meus aposentos, mulher – ele ordenou.